Este é o título do livro que estou lendo no momento. Escrito
pela jornalista XINRAN, traduzido por Manoel Paulo Ferreira e publicado pela
Companhia das Letras, em 2003.
Trata-se de um livro escrito a partir de fatos e depoimentos
reais e é tão interessante que a minha vontade é de contar tudo o que leio a
vocês.
Vou, então, destacar algumas passagens que elucidam um pouco
da decantada “liberdade” da Revolução Comunista na China e, acredito, em muitos
outros países.
Tanto o livro quanto os textos destacados no mesmo atentam
para o lado pessoal e não político, notadamente o lado das mulheres. Confiram:
Pra começar, um antigo provérbio chinês, atribuído a
Confúcio:
"Numa mulher, a falta
de talento é uma virtude.”
Hábitos austeros conduziam as pessoas e as famílias:
“Na casa do meu avô vigoravam
normas severas. Às refeições, se alguém fizesse um ruído ao comer, afastasse a mão
esquerda da tigela de arroz ou violasse alguma outra regra, meu avô pousava os
pauzinhos e se retirava. Depois disso, ninguém podia continuar comendo e todos
tinham que ficar com fome até a refeição seguinte.”
A tal “liberdade” e “igualdade” advindas com o comunismo são
descritas em muitas passagens, sussurradas por mulheres medrosas, apavoradas
com o que sofreram, sem voz, nem vez. Vítimas inocentes de fanatismos políticos
dos quais nunca sequer chegaram a tomar parte.
“Como filha de um
burguês capitalista, minha mãe logo foi detida para investigação também e
proibida de voltar para casa. Meu irmão e eu fomos transferidos para
acomodações para crianças cujos pais estavam presos.
Na escola eu era
proibida de dançar e cantar com as outras meninas, para não “poluir” a arena da
revolução. Embora míope, não podia sentar na primeira fileira da sala, porque
os melhores lugares eram reservados para os filhos de camponeses, operários ou soldados,
que tinham “raízes retas e brotos vermelhos”. Também não podia ficar na
primeira fila nas aulas de Educação Física, embora fosse a menor da classe,
porque os lugares perto do professor erma para a “próxima geração da revolução”.
Junto com as outras crianças
“poluídas”, cuja idade ia de dois a catorze anos, meu irmão e eu tínhamos que
assistir a uma aula de estudos políticos depois da escola, e não podíamos
participar de atividades extracurriculares com as crianças da nossa idade. Não tínhamos
permissão de assistir a filmes, nem mesmo aos mais ardorosamente revolucionários,
porque tínhamos que “reconhecer completamente” a natureza reacionária das
nossas famílias. Na cantina, éramos os últimos a serem servidos, porque meu avô
paterno havia “ajudado os imperialistas britânicos e americanos a tirar comida
da boca dos chineses e roupas dos seus corpos.”
O pai da menina em questão era membro da Associação Chinesa
de Engenheiros mecânicos de Alto Nível e especialista em mecânica elétrica. O
avô paterno havia trabalhado durante trinta e cinco anos para a empresa britânica
GEC. E, por haver muitos objetos de arte e históricos na casa deles, foram
acusados de serem “representantes do feudalismo, do capitalismo e do revisionismo.”
“Lembro dos guardas
vermelhos remexendo na casa toda e de uma grande fogueira no nosso pátio, onde
lançaram os livros de meu pai, os preciosos móveis tradicionais de meus avós e
meus brinquedos. Meu pai tinha sido preso e levado embora. Assustada e triste,
fiquei olhando as chamas, estuporada. Como que ouvindo os pedidos de socorro
vindos do meio delas. O fogo consumiu tudo:
a casa que fazia pouco tempo eu chamava de minha, minha infância até
então feliz, minhas esperanças e o orgulho da minha família com sua cultura e
seus bens. Deixou-me mágoas ardentes que levarei comigo até a morte.
À luz do fogo, uma
garota com uma braçadeira vermelha veio na minha direção empunhando uma grande
tesoura. Agarrou as minhas tranças e disse: “este estilo de cabelo é pequeno-burguês.”
Antes que eu
entendesse o que ela dizia, cortou as minhas tranças e jogou-as no fogo.
Arregalei os olhos, sem fala, vendo as tranças e os laços bonitos se
transformarem em cinzas. Quando os guardas vermelhos foram embora, a garota que
me havia cortado as tranças me disse: “A partir de hoje você fica proibida de
prender o cabelo com fitas. É um estilo de cabelo imperialista!”
Afastadas dos pais, jogadas em abrigos, hostilizadas, as
crianças forma vítimas inocentes da Revolução.
“Um dia levei meu
irmão, que ainda não tinha três anos, para o fim da fila da cantina, que estava
excepcionalmente comprida. Devia ser dia de alguma celebração nacional, pois
era a primeira vez que vendiam frango assado e por toda parte sentia-se o cheiro
delicioso. Ficamos com água na boca, porque fazia muito tempo que só comíamos
sobras, mas sabíamos que para nós não haveria frango.
De repente meu irmão
começou a chorar, gritando que queria frango. Com medo de que o barulho
irritasse os guardas vermelhos e de que nos pusessem para fora, deixando-nos
sem comida alguma, fiz o melhor que pude para convencê-lo a parar de chorar. Mas
ele, cada vez mais agitado, continuou chorando. Eu, de tão preocupada, também
estava à beira das lágrimas.
Nisso uma mulher de ar
maternal passou por nós. Pegou um pedaço da sua porção de frango assado, deu ao
meu irmão e foi em frente, sem dizer uma palavra. Meu irmão parou de chorar, e
estava prestes a começar a comer quando um guarda vermelho veio correndo,
tirou-lhe a coxa de frango da boca, jogou-a no chão e esmagou-a com os pés.
“Seus filhotes de
lacaios do imperialismo! Acham que também podem comer frango, é?” berrou.
Então, refletiram? Tiraram alguma conclusão?
Se quiserem, fiquem à vontade para comentar.
2 comentários:
Isso é muito triste, mas é interessante ler sobre outras culturas, mesmo que não seja de acordo com os costumes e preconceitos.
O radicalismo em qualquer situação é repugnante,por ser o poder na visão de quem considera que tenha que seu poder tem o direito supremos de sua lei.Por querer ter poder já é corrompido.A história do mundo já nos mostra o como começa e o até onde vai,mas o homem não foi feito para ser dono do mundo...acaba que adoece deste poder,corrompendo sempre a boa causa, se é que alguma vez houve.é bom ler,para se ter consciência,lucidez e sensatez.
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