domingo, 5 de fevereiro de 2017

VERGONHA À BRASILEIRA!




                 Não se passa pela vida impunemente, a menos que optemos por uma atitude meramente contemplativa, como se estivéssemos por aqui apenas a passeio. Perdemos muitas coisas e pessoas pelo caminho, sufocamos ideais, desistimos de sonhos, mas não podemos perder a capacidade de indignação frente aos desmandos de certos segmentos da dita “sociedade brasileira”, pois este é o primeiro passo na busca das transformações.
As cidades voltam a ficar inundadas de discursos demagógicos, promessas, cartazes sorridentes alimentando a fogueira das vaidades e a busca pelo poder. Poder de quê? De manter o estado de coisas, as disparidades sociais, a política desumana de segregação, beneficiando sempre a mesma minoria privilegiada  em detrimento da verdadeira massa popular, cada vez mais oprimida?
Crescem as queixas pelo aumento da violência e o povo morre de medo ao andar nas ruas, sem perceber que está sendo roubado desenfreadamente pelos colarinhos engomados que desfilam nos palácios e ministérios impunemente.
Difícil é convencer as crianças e os jovens de que alguns nasceram apenas para aplaudir o que outros vestem e comem, sem direito algum a experimentar tais prazeres. Olhar nos olhos de alunos de escolas públicas e lhes garantir que o vestibular foi criado apenas para os ricos, aqueles que podem pagar cursinhos caros, enquanto para eles restará apenas o subemprego.
A revista Isto É , num único número, trouxe duas reportagens bem elucidativas sobre este problema. Uma trata de escolas e outra de hospitais – sem dúvida instituições da maior importância para qualquer sociedade.
Em São Paulo, estudantes privilegiados vivenciam “a aula do futuro”, com salas de aula onde o computador substitui o caderno e quadros-negros mostram imagens saltando da tela em terceira dimensão. Os deveres são preparados em disquetes, as lições aprendidas em CDs Room, familiarizando os alunos com as tecnologias com as quais vão se deparar no mercado de trabalho. Tudo pela bagatela de R$ 700,00 mensais. Ah, se em todo o Brasil fosse assim...
Na maioria das escolas de rede pública faltam professores, material didático básico, quando não água, merenda e até espaço físico para acomodar tantos alunos carentes.
No Rio de Janeiro a grande melhoria está nos hospitais. Hospitais cinco estrelas, com suítes de 50 metros quadrados, dois banheiros, saleta com TV de 29 polegadas, concertos ao vivo, pratos finos acompanhados de champanhe francês, serviço de cabeleireiro, heliporto, ambiente climatizado . Segundo os idealizadores, tudo isso para garantir um atendimento mais humanizado, tornando os hospitais mais aprazíveis e estimulantes para a recuperação dos doentes. O preço só assusta pobres – R$ 1.300,00 a diária.
Não é preciso descrever a situação da maioria dos hospitais brasileiros, com suas enfermarias e corredores superlotados, numa promiscuidade desumana, tornando quase impossível a recuperação de quem quer que seja.
Daí a pergunta: o que o Brasil está querendo mostrar ao mundo nesta época de globalização? Para se livrar da pecha de carnavalesco e futebolístico apenas, entra para o livro dos recordes como o país de maior disparidade social que se tem notícia. Grande conquista!
E olha que aqui foi mostrada apenas uma pequenina ponta deste vergonhoso iceberg . A sujeira é tanta que nem gigantescos tapetes persas conseguiriam encobri-la.
Mais uma vez é hora de se indignar, de tentar mudar, de gritar mais alto que as mentiras disfarçadas em belos discursos. Candidato bom é aquele que sabe o quanto terá de lutar, de se esforçar, se sacrificar pelo povo e mesmo assim sente esta vocação, possui este desprendimento de deixar de pensar em si para assumir os problemas comunitários. Poucos têm este objetivo, menos ainda pensam em levar a sério o que prometeram com tanta facilidade e a nós, eleitores, cabe examiná-los com potente lupa para deixarmos de ser ludibriados e precisarmos conviver com este estado de coisas que, sem dúvida alguma, um conhecido apresentador de TV classificaria como:
“- UMA VERGONHA!”

agosto de 2000.



Crônica publicada no livro GAZETEANDO (2007)

 

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