Até aquele
momento da vida tivera uma vaidade mediana, dessas que não chegam a escravizar,
mas que não dispensam um ok do
espelho.
Em parte porque
sempre obtivera boas respostas do corpo, da pele e dos cabelos aos tratamentos
e cuidados triviais dispensados por uma mulher ocupada e produtiva.
Se a genética
não ajudava, sua determinação e a agitação da vida profissional e familiar
auxiliavam qualquer regime de emagrecimento a dar resultados imediatos e
satisfatórios. Bem, o cigarrinho contribuía bastante, verdade seja dita.
Nem contos de
fadas são legais até o fim e, nesse caso, não foi diferente. Com a chegada da
“pior idade” sua autoestima iniciou a desandar, em virtude dos inúmeros
problemas surgidos. Por um calendário maquiavélico, sua determinação em parar
de fumar coincidiu com a aposentadoria e a chegada da menopausa. O resultado
foi presumivelmente desastroso – vinte quilos de algo que não lhe pertencia
aderiram ao seu corpo, outrora curvilíneo e elogiado.
No início,
portanto, da tal decantada idade de descansar, celebrar a vida e outras balelas
do gênero, o que sobrou foram dores musculares, problemas de visão, obesidade,
queda de cabelo, taxas alteradas nos exames de rotina, além das marcas do tempo
desenhando o rosto.
Ela tentou.
Espartanamente,
seguiu à risca as orientações médicas e profissionais, entupiu-se de vitaminas
e remédios, no entanto, parecia que era a única entre suas contemporâneas a
passar por aquilo e a desandar diante dos espelhos cruéis espalhados
sadicamente pela casa.
Ao invés dos
admiradores e das invejosas de outrora, hoje percebia olhares piedosos,
disfarçados, surpresos. Não suportando mais a situação limite em que vivia,
começou a se fechar dentro de casa e dentro dela mesma, evitando os
comentários, a maledicência, a piedade mal disfarçada no semblante dos mais
próximos e também dos desconhecidos.
Fugia do sol,
do mar que tanto amava, das festas, dos encontros e entristecia na mesma
proporção em que seu corpo se deteriorava.
A frustração
chegou ao limite num encontro de ex-colegas do curso Ginasial. Todos mais
jovens, mais elegantes, mais cabeludos, mais conservados. A não ser os que já
tinham morrido.
Nesse dia, no
auge do desgosto, ela chegou em casa, cortou os cabelos rentes à cabeça, uma
vez que tinham sido volumosos, bonitos, indomáveis e agora não paravam de cair,
vendeu o carro, colocou algumas roupas numa mala, juntou as economias e comprou
uma passagem – só de ida! – para um país distante e tropical. E foi embora,
assim, como quem sai de cena.
No destino
escolhido bronzeou o corpo avantajado em biquínis minúsculos, escolhidos apenas
pela cor e o modelo como antes, manteve o cabelo curtinho sempre ao natural,
meio branco, meio falhado, mas livre e macio, abandonou os remédios e vitaminas
inundando-se de sol e água salgada, namorou um morenão que a achava linda e
colocou sua vida sexual em dia.
Finalmente
voltou a sorrir e a ser feliz!
2 comentários:
Que história maravilhosa! Um conto de fadas real. E eu que pensava que suas histórias não tinham finais felizes. E o mais interessante é que fiquei até o último instante esperando por uma tragédia! Preciso me redimir.
Estou louco para ler mais histórias como esta; afinal, para a crueza da vida, à ilusão.
Abraço!
hahaha... nem todas as histórias têm finais trágicos, ou infelizes, só a maioria... como na vida real. Bom carnaval amigo!
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