FERNANDO PESSOA
O muito, ou pouco que aprendi a fazer é bem melhor executado
por outras pessoas, que se especializaram nisso ou naquilo.
Múltipla, concentrei meus esforços num leque de afazeres que
me permitiu acompanhar a urbe para todos, ou quase todos os lados.
Colecionei elogios e injustiças, guardando-os no mesmo
compartimento, a fim de que se neutralizassem.
O que fiz de melhor foi gerar e educar filhos. Nisso me
considero muito acima da média, pois meus meninos reúnem o que de melhor encontrei
pela vida.
Não sou medrosa. Por vivência, tenho pavor à cegueira; por
observação, aprendi a temer o mal de Alzheimer. Sem meu cérebro e meus olhos
estaria acabada, como uma embalagem vazia que só serve para descarte, ou
reciclagem. Eu não me reciclaria, pois não sei fazer mais nada que dispense o
ver e pensar.
Não me destaco em nada, no entanto, me esforço bastante.
Estou sempre educando, ensinando, trocando em miúdos, transformando.
Sempre há quem faça mais e melhor, ainda que veja muita
mediocridade em destaque, com louros indevidos e glórias imerecidas.
Não sou nada, não sou ninguém, uma formiga, um grão de
areia, um corpo sedentário numa cabeça desmotivada.
Gosto de ler, me alimento de letras, uso mil códigos para
desvendar as entrelinhas de todos os livros, matérias, poemas. Fico radiante
quando consigo me emocionar, quando alcanço a plenitude desejada através
daquelas letras. E frustrada ao ver que tanta coisa ruim se sobressai, com
brilho falso e efêmero, sem me convencer.
A vida também é nada. O jeito é sermos nada com ela,
conscientes da nossa insignificância, indiferentes aos brilhos falsos, às
glórias efêmeras, a quem acha que algo ou alguém ficará para sempre.
“Todos estes que aí estão
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho!”
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho!”
MARIO QUINTANA
Um comentário:
Aplausos para o texto! Apenas não concordo com:"Não me destaco em nada, no entanto, me esforço bastante."
Cara amiga, estás muito dura e crítica consigo mesma. Bjo
A
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