segunda-feira, 29 de julho de 2013

ENFRENTANDO UMA SEGUNDA-FEIRA




          Minha avó sempre dizia que a segunda-feira determinava o restante da semana, por isso, nela não deveria acontecer nada ruim, não devíamos realizar trabalhos muito pesados, nem nos atritar com ninguém. E que, quando surgiam muitos problemas nesse dia, a semana seria de lascar!
           Não tenho muitas crendices ou superstições, todavia, algumas coisinhas que ouvi reiteradamente daquela que foi minha segunda mãe, que me cuidava para minha mãe trabalhar, ficaram tatuadas nas minhas lembranças e não posso ver chinelo virado, por exemplo, que logo desviro.
          Nem sempre temos o controle da nossa vida. Por mais que imaginemos conduzir as rédeas da nossa existência, vez por outra nos deparamos com situações que independem de nós e nos atingem em cheio. Nessa hora, temos a exata dimensão de uma vida partilhada e do ônus de se viver em família, trocando carinho e ajudando a todos.
          Quem tem idosos na família sabe que precisa contar com vários auxílios e que as pessoas, mesmo pagas, nem sempre cumprem seu papel com a paciência e a delicadeza necessárias. Os governos se preocupam bem mais em aumentar os direitos dos empregados domésticos e quase nada com a sua formação, ou preparação para o trabalho. Os verdadeiramente aptos querem ganhar mais do que um médico ou alguém que ralou anos a fio numa universidade.
          Na outra ponta, os casais precisam trabalhar fora, um salário já não sustenta uma família e as crianças vivem despejadas em escolinhas os dias inteiros, expostas a várias situações para as quais ainda nem estão amadurecidas e dependendo de quem lhes dê alimento, troque sua roupa e, se sobrar tempo e cansaço, um pouco de carinho também. Muitos avós acabam assumindo a função de pais novamente, acudindo a novíssima geração, pelo menos até que  ela saiba contar e reclamar do que vivencia.
          Os avós que trabalharam fora a vida toda, quando se aposentam, ao invés de finamente poderem fazer o que gostam, viajar, esquecer o relógio, cuidar de si, voltam a ter horários rígidos e mãozinhas pequenas dependendo das suas. É trabalhoso, é cansativo, mas também é gratificante.
           Daqui a poucos dias assumo mais uma netinha para cuidar. A primeira, já virou até escritora e bailarina, agora vamos descobrir os talentos da pequerrucha e ver do que ela gosta mais.
          Terei bem menos tempo para escrever meus próprios livros, inclusive porque a escritura demanda bem mais do que tempo cronológico, há toda uma preparação espiritual a ser feita antes de traduzir em letras a nossa criatividade.
           Minhas professoras de pilates e hidroginástica serão abandonadas, sempre com a promessa de um dia voltar...
          “Toda a natureza é um serviço. Serve a nuvem, serve o vento, serve a chuva...” já dizia Gabriela Mistral.  Servem as avós também.
           Sempre sobram os finais de semana... ah, mas e o almoço dominical?
           Meu filho mais velho critica minha necessidade de reclusão e paz de vez em quando, pelo menos à noite. Poder ouvir o que a TV está dizendo é sempre bom... concordam?    Cabeça de escritor é fértil, recheada de letrinhas, capazes de fazê-la explodir se não são as deitamos logo ao teclado, ou ao papel. A boca, todavia, é espartana nas palavras, econômica. Observa bem mais do que fala. E, se não for assim, não escreverá nada que permaneça.
           Uma segunda-feira cheia de novos rumos e uma vozinha bem conhecida reclamando minha presença lá do sofá da sala, pois essa que ajudo a criar desde que acabou a licença maternidade da mãe, já está com cinco anos e continua por aqui:
          - Vovó, vem pintar comigo!
          Eu vou, é claro!


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