segunda-feira, 24 de setembro de 2012

CHEIRO DE PRIMAVERA



Sei que "perfume de primavera" soaria melhor, entretanto, quem, com mais de 15 anos, se interessaria em ler um texto com este título? Perfume me parece algo mais elaborado e cheiro mais original, mais forte. Pois foi um cheiro de primavera que senti no ar esta manhã. Uma mistura de flores e plantas, de chás, de terra, de pássaros. Bendita hora em que larguei o cigarro e pude recuperar meu olfato, com todas as sutilezas dos cheiros naturais. É claro que existe o outro lado, daqueles perfumes fortes, desagradáveis que grudam no nariz da gente só de cumprimentar a pessoa em questão. Afinal, parece que tudo tem dois lados mesmo; frente e verso; certo e meio certo e por aí afora.
Uma querida leitora e comentarista "d'além mar" me fez questionar algumas concepções de vida e de trabalho que, com certeza, merecem uma reflexão maior. Esta é uma grande vantagem dos comentários que recebo, pois minha escritura fica sendo uma via de mão dupla, como deve mesmo ser. Caso contrário, morrerei (ou viverei) acreditando nas minhas verdades e enfiando, goela abaixo nos leitores, certezas questionáveis.
Por que trabalhar novamente depois de tantos anos de serviço e sem necessidade imperiosa do dinheiro? Quem já não suspirou pela aposentadoria e pelo direito de ir e vir sem horários controlados? O que leva a pessoa, então, a voltar ao batente?
Sempre ouvi falar de pessoas totalmente desadaptadas à aposentadoria. E não as compreendia. Imaginava que seriam pessoas sem nada melhor para fazer e sem capacidade de fazer amizades ou se divertir num programa mais interessante que o trabalho. Para algumas, isso deve mesmo caber. No entanto, para que a gente saiba o que significa aposentar tem que saber o que representa para nós "trabalhar".
Um dos meus meninos, engenheiro metido a filósofo, me fez ver que meu lazer está profundamente ligado ao meu trabalho e, portanto, ler e escrever não tem a mesma conotação que o trabalho da maioria das pessoas tem para elas. Quando não estou trabalhando, faço quase as mesmas coisas que fazia no trabalho, ou seja, leio, escrevo, corrijo, assisto filmes, ouço música, toco piano.
Curioso é que, quando me aposentei,  toda a família (da mãe aos filhos) achou que eu deveria aceitar as novas propostas de trabalho (em cursinhos pré-vestibular), pois seria mais feliz novamente envolvida com alunos, redações, etc. Ninguém disse que eu deveria descansar, passear no Shopping, fazer tratamentos estéticos, essas coisas que as mulheres fazem quando se aposentam. Como é possível a gente ser mais feliz quando tem a liberdade tolhida por conta dos compromissos assumidos com o trabalho?
Adorei dormir um pouco mais de manhã, principalmente nas manhãs frias, de chuva. Foi muito bom fazer supermercado sem pressa, gastando mais, é verdade, mas com muito mais qualidade. Nem sabia como poderia ser tolerante com a flexibilidade de horários em médicos, dentistas, bancos, cabeleireiro, sem xingar os atrasos ou ficar praguejando nas filas. Nesse ponto, creio que me tornei uma pessoa bem melhor. Hoje não corro rua afora, apenas caminho e ainda olho as vitrines.
Difícil foi conviver com a sensação de que nada do que eu tenha feito no dia tivesse alguma relevância. De que ninguém realmente precisava dos meus serviços ou das minhas habilidades e que as pessoas estavam muito mais ocupadas que eu, sem tempo para prestar atenção naqueles detalhes tão significativos para mim. Só se todos os meus amigos fossem aposentados, mas nem meu marido ainda o é. Quando os filhos estavam em casa é que eu gostaria de não precisar trabalhar, só que nesse tempo eu precisava, por eles principalmente.
Sei que não elucidei grande coisa, tentei refletir um pouco mais sobre a questão, entretanto, no dia em que tiver as verdades prontas e definitivas, penso que não escreverei mais, uma vez que não terei a oportunidade de forjar mudanças.
No momento, é assim que penso. Acho que a aposentadoria soa diferente para cada pessoa e a minha antecedeu por alguns meses o nascimento da minha netinha, de quem cuido há quatro anos, sem tempo para sentir saudades dos bancos escolares.
Hoje a Primavera está chegando, cheia de pólen, de beleza, de espirros, de alergias, de ventos, decretando o fim dos casacos que, afinal, quase nem foram usados e mandando todo mundo correr atrás do prejuízo, antes que chegue o verão e os trajes de banho.
Vamos malhar!



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