segunda-feira, 10 de abril de 2017

NÃO É SÓ UM ARMÁRIO.



                          Dizem que sou saudosista. Talvez seja. Gosto de lembrar das coisas boas, estejam elas no tempo em que estiverem. Já as más bloqueio logo e nunca mais quero lembrar.
                         Também não me considero apegada aos bens materiais, entretanto, tenho um apego diferente pelos objetos que fizeram parte da minha vida. Até para trocar de carro é necessário um verdadeiro mutirão familiar e vou, de coração partido, entregar o antigo para trocar pelo novo.
                         Meu piano, que fica na casa da minha mãe, foi atacado cruelmente pelos cupins e está condenado. Ganhei um novo, mas quem diz que consigo me desfazer do velho?
                          Agora, resolvi ajeitar este quarto, que já foi de dois dos meus filhos, para que se transforme num escritório e quarto de hóspedes eventual. Depois que eles saíram de casa, um porque casou, outro porque foi trabalhar fora, aos poucos fui me ajeitando por aqui, trazendo meus tesouros, meus livros, meu computador e é aqui que passo as melhores horas do meu dia.
                        Pois bem, um projeto mais moderno e funcional dispensou o grande armário que mandei fazer para eles há bastante tempo, daqueles de madeira grossa, puxadores firmes que resistiram aos netos sem se mexer e ainda uma escrivaninha embutida onde filhos e netos estudaram para tantas provas.
                       “É só um armário” – repito para mim mesma, no entanto, olho para ele e revejo os meninos, suas roupas, seus jogos eletrônicos, seus livros...
                      Daqui a pouco os homens chegam para desmontá-lo. Doei para uma mãe pobre que não tem onde guardar as roupas dos seus meninos que ainda estão em casa.  Que sejam bem felizes com ele, o tratem bem e aproveitem um móvel feito com capricho por um carpinteiro que trabalhava sozinho, me deixava pagar em suaves prestações e cujos móveis têm a solidez de um mundo perdido, de coisas duradouras, ao invés dos tempos descartáveis de agora.
                       Não quero vê-lo ser partido em pedaços, nem levado embora.
                       Pior foi ver meus meninos arrumarem suas roupas para partir.
                       Daqui a pouco estará tudo novo, tudo bonito e o velho armário ficará guardado no baú das recordações, cada vez mais cheio e mais precioso.



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