Quando refresca um pouco, o sol se distancia e permite o
sopro do vento, ouso andar pelas ruas fazendo meus caminhos a pé.
E vejo coisas e gentes de todos os tipos. Gente bonita,
gente feia, gente esquisita, gente apressada, gente alta, gente baixa, magros
demais, gordos em excesso, arrumados, desleixados, apressados, distantes,
sorumbáticos. Mesmo morando neste mesmo bairro há quarenta anos, não conheço
muita gente; antes, trabalhava tanto que não tinha tempo nem de olhar para os
lados, depois concentrei minha comunicação nas redes sociais, com os amigos
antigos, da minha cidade e dos lugares onde trabalhei. Por isso, a maioria dos
que passam por mim são “ilustres desconhecidos” (meu pai usava esse termo
amiúde).
Com essa minha mania de pensar, ainda no meio do caminho
fiquei conjecturando sobre o quanto a vida de hoje é visual. As pessoas falam
pouco, quase não ouvem música, mas olham para tudo e para todos, principalmente
para o mundo que se descortina em seu aparelho de telefone celular.
Quando meu pai perdeu a visão, passamos a ter o maior
cuidado para não comentar coisas do tipo! “-Olha lá!”
A degeneração macular da minha mãe não permite que ela
perceba detalhes, então, vivemos descrevendo pessoas e coisas pequenas para
ela. E sofremos quando não conseguimos que ela veja, por exemplo, as fotos do
Japão que o neto caçula envia, ou que veja seu rosto nas ligações por Face time
que fazemos com ele. Mas ela raramente se queixa. Menos mal.
Como pudemos viver sem fazer uma “self”?! Hoje, quando garimpamos
fotos envelhecidas para nos vermos crianças – e ainda nos emocionamos com elas
– penso no manancial de registros que essa novíssima geração terá! Meus filhos
já tiveram muitos álbuns, muitas fotos e até algumas filmagens com uma
filmadora enorme e grossas fitas. Minha mãe também fez álbuns para os filhos,
ainda que com menos fotos e tiradas por fotógrafos profissionais, em ocasiões
específicas. Agora, os netos... chega a ser um exagero! Eu, que sou avó, tenho
muitos álbuns de cada um deles, fora os DVDs, as pastas no computador, a
galeria no celular, enfim, eles são registrados em tudo que fazem. Tudo visual.
Seria bom se o mundo tivesse mais sons agradáveis! Não
apenas barulho de carros, buzinas, aspirador de pó, liquidificador, cortador de
grama. Que o mundo tivesse mais música, mais voz de criança cantando, mais
instrumentos musicais sendo praticados, mais conversas, poesias, amenidades.
Nossos olhos se cansam de tanto ver, ver, ler, ler. E os ouvidos chegam a se
fechar diante dos barulhos, sem nada agradável para registrar, como o canto dos
pássaros, a água rolando das cachoeiras, a conversa das crianças, sem gritos,
choro ou birra, a lentidão dos idosos contando seus casos, as juras de amor.
É muito bom poder ver, sem dúvida, mas ouvir não fica atrás.
Eu adoro quando eles chegam e dizem da porta:
- Mãe!
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