sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

SE CONSELHO FOSSE BOM...




Ela era uma beldade original e fabricada, daquelas que já nasciam com um diferencial e ainda se cobriam de creme, se enchiam de botox, se espremiam em espartilhos e experimentavam cada nova fórmula rejuvenescedora. Mesmo bela, inconformava-se com a passagem do tempo, como se tentasse congelar sua imagem dos anos dourados.
Um cabelo fino e claro emoldurando grandes olhos azuis, dentes simétricos, mãos pequenas e uma charmosa timidez faziam de Suelen uma mulher bonita, sem dúvida. A questão é que lhe faltava um algo mais, uma coisa difícil de descrever até para os homens que se sentiam atraídos por ela. Numa bonita casca e com um espírito sem maldade, ela não fazia sucesso entre o público masculino e suas amigas não entendiam por que.
Suelen era quase ingênua, acreditava em tudo o que ouvia e perdia muito tempo diante do espelho, como se fosse, rodriguianamente falando, “uma namorada lésbica de si mesma”. Com isso, não evoluiu muito nos estudos e vivia folheando revistas de fotonovelas e fofocas, já que nem mesmo romances tinha paciência e concentração para ler.
Suas amigas dançavam as noites inteiras nos bailes, namoravam os rapazes mais disputados, destacavam-se na escola e a pobre menina bonita tinha que se conformar sempre com os piores candidatos, mais interessados em explorar sua beleza imatura do que em  se apaixonar por ela.
Foi assim que, numa viagem de seus pais, driblou a atenção da empregada, bem orientada por um namorado inescrupuloso e perdeu sua virgindade na escada de sua casa, em pé, de um jeito muito diferente daquele que lera nas revistas e sonhara.
Dentro de uma pequena probabilidade, Suelen se descobriu grávida, ainda adolescente, numa época em que não desfruta de liberdade sequer para ir ao cinema à noite. E o mundo caiu. Foi expulsa de casa pelo pai rigoroso, que mais tarde se descobriu cheio de amantes, e teve que deixar a companhia da mãe e das irmãs para viver na casa de uma sogra que mal conhecera. Pobre moça! A mãe a visitava escondido e ela comeu o pão que o diabo amassou pelo deslize cometido.
Quando o bebê nasceu – uma menina gorducha, parecida com a família do pai – seu pai se recusou a conhecê-la e, mais uma vez, foram as amigas que deixaram seus dias menos tristes e difíceis.
Dizem que o tempo é um santo remédio para tudo, mas as dores de Suelen não passaram, nem se tornou mais amena a convivência com aquele que mal conhecera e tivera que tomar por marido. Ele a enganava, ofendia, tripudiava sobre seus cabelos loiros e seus olhos azuis, mesmo sendo feio e grotesco.
Um dia, ele se cansou da vida mais ou menos regrada que precisava levar e foi embora, deixando mulher e filha para trás. A vida melhorou para a pobre moça, pois ela pôde se reaproximar da casa paterna, ainda que ouvindo ofensas nada sutis e recriminações constantes.
Sangue não é água e a filha, crescida, fê-la passar maus bocados em virtude da índole torpe que herdara do pai. Mais uma vez Suelen sofreu, sem desistir nunca de se cuidar, de se enfeitar, polir os atributos que a natureza lhe dera, ainda que não encontrasse alguém merecedor de desfrutá-los.
Um dia, cruzou seu caminho um homem mais bem posicionado na vida, embora pouco atraente e de conduta duvidosa diante das mulheres. Carente, Suelen julgou ter encontrado seu príncipe encantado e ficou logo perdidamente apaixonada.
Mais do que nunca, perdeu horas a fio nas clínicas de estética e torrou seu salário nas lojas de roupas e calçados. Avisou as amigas que estava diminuindo a idade, porque ele era mais moço que ela e pediu que nunca a contestassem na frente dele.
Casaram, tiveram filhos, mas não foram felizes para sempre, porque ele a traía com mulheres feias e muito mais velhas, no entanto bem mais interessantes do que ela, segundo esbravejava para quem quisesse ouvir.
E outra vez Suelen – loira e linda – tinha embarcado numa canoa furada e de nada serviam seus dotes estéticos ou a cinturinha que conservava à custa de muita fome e espartilhos torturantes.
Chorava na casa das amigas, fazia promessas, macumba, despachos, para cada santo uma vela e nada do homem feio se emendar.
Seguia todos os conselhos que lhe davam, alguns até contraditórios, sem resultado.
Até que, um dia, uma amiga mais experiente resolveu incrementar sua vida sexual para ver se dava certo.
 Suelen casara duas vezes e nunca tinha ido a um motel. Alegava mil coisas, um pavor de contaminação, nojo dos frequentadores, no entanto, para ver se segurava o marido, estava disposta a tentar.
 A amiga resolveu ajudar e, para minimizar seus imensos temores, usou um conselho da sua ginecologista (nos idos tempos) de que jogasse álcool na banheira de hidromassagem e riscasse um fósforo para liquidar com os micro inimigos que tanto assombravam Suelen.
Ela seguiu à risca e, depois de repetir as poses estudadas no espelho de casa, desfile de lingeries provocativas e rendadas e de experimentar diversas formas de sedução, partiu para a higienização total do recinto. Caos total. A banheira já não era de louça, como no tempo da amiga, e sim de microfibra e se encolhia e repuxava diante das chamas. Os vitrais (de plástico) do teto começaram a despencar e por pouco não foi preciso acionar o Corpo de Bombeiros. A vergonha e o prejuízo colocaram a pá de cal que faltava no relacionamento dos dois.
Não teve mais conserto possível.
 Acabou.
E foi melhor assim.




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