terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

A PENEIRA DO TEMPO



Não sabemos de quanto tempo dispomos no mundo. Melhor assim. Caso contrário, seria nossa passagem por aqui tão programada que pouco sobraria para o inusitado, a aventura, as tentativas, aquilo tudo que dá sabor à vida.
Dizem alguns que, na hora da morte, costuma passar um tipo de filme da vida da gente. O que esperamos ver nesses instantes derradeiros? Os erros, os acertos, os riscos, o bom, o ruim?
Já falei aqui que não sei meditar, acho dificílimo esvaziar a mente e só ver cores nela. Agora, pensar eu sei e o faço até com certa desmedida.
Num desses momentos em que meus olhos voam, tentei contabilizar meus feitos nesta vida e fiquei cansada.
Quantas fraldas troquei, quantas mamadeiras preparei, quantos banhos dei, quantas unhas cortei, quantos beijos e abraços dei, quantas provas corrigi, quanta louça lavei, quanta comida  e merendas para a escola preparei, quantas músicas toquei no piano, quantas cantei, quantas dancei, quantas ouvi, quantas cartas escrevi, quantos filmes assisti, em quantas brigas me envolvi, quantas orações fiz, quantas fotografias, quantos sorrisos, quantas lágrimas, quantos "não" fui capaz de dizer, quanta saudade, quanta ingratidão, quantas calúnias sofri, quantos prejulgamentos fiz, enfim, todas essas coisas que compõem a VIDA.
A vida é tudo isso. E é muito pouco.
Na fina peneira do tempo só os grandes permanecem. O que terei feito de "grande", que não se escoe pelos furinhos da peneira dos dias, meses e anos?
Até aqui, mesmo tendo sido pró-ativa a vida toda, só encontro quatro talentos retidos na malha fina - meus três filhos e meus livros, sendo que dois filhos já trazem seus rebentos ao colo. E é só.
Percebo que o mundo passa muito bem sem mim e que não sou absolutamente importante para nenhum projeto da humanidade. Minha biografia é desinteressante de tão normal e mesmo os pequenos voos, que julguei tão ousados, não são nada diante da experiência da maioria dos escrevinhadores.
Espero ainda ter tempo de escrever mais livros e, quem sabe, contribuir efetivamente para a roda do mundo, destacando muitos outros talentos na minha peneira.
Oxalá!


Um comentário:

Paulo disse...

Olá, Malu!
Acho que contribuímos, quer queira, quer não, para a roda do mundo. Lendo um de seus textos, descobri a poesia que fala da felicidade que nunca a pomos onde estamos. Se quiser saber, chegou num momento bem especial para mim. E a repassei para alguém também muito especial.
Abraço!