Que a infância é a melhor parte da
vida é quase um consenso. Às vezes, não nos damos conta disso quando ainda
somos crianças, mas depois... mesmo pessoas que tiveram uma infância pobre ,
cheia de privações, ainda encontram bons momentos para recordar. Apenas
crianças que sofreram maus tratos não gostam de lembrar da infância.
Por esta certeza é que concluí, não
faz muito tempo, que as melhores coisas da vida dependem do contexto em que
acontecem. Assim, uma macarronada com a família reunida, alegre, falando junto,
rindo, certamente será a melhor macarronada do mundo e não adianta repetir a
receita num ambiente hostil que o sabor irá embora.
Sempre gostei muito de cozinhar e as
melhores lembranças de temperos, massas, doces de calda certamente trago da
minha infância e da cozinha da minha avó.
Meus sobrinhos, certa vez, comeram um
pavê de chocolate feito por mim, numa época em que eles brincavam o dia todo,
nas férias, na casa dos avós. Nunca mais esqueceram e, já moços, pediam à mãe
que conseguisse a receita comigo. De certa feita ela pediu, fez exatamente
igual e eles não reconheceram o sabor. Por quê? Porque faltava a infância, os
animais no quintal, as crianças livres na rua, os avós, as férias.
Para confirmar minha tese andei
perguntando para várias pessoas o sabor de que eles mais lembravam e a que ele
estava associado. Todos remetiam à infância, embora variasse a pessoa que
preparou e o próprio alimento.
Minha mãe diz que atravessava a rua
para comer mingau na casa da vizinha de frente, embora os da mãe dela fossem
deliciosos. Acontece que a vizinha era um doce de pessoa e tratava as crianças
muito bem, já a mãe dela era brava e exigente.
Meu pai sempre falava num doce de
batatas que ninguém fazia igual à mãe dele. De certa feita, minha mãe pediu à
sogra que preparasse para ela aprender. Ele ficou decepcionado, não
reconhecendo mais o sabor da sua infância.
Minha mãe nunca soube nem gostou de
cozinhar. Mesmo assim, fazia um bolo aos sábados, quando não trabalhava na
escola. E, para nós, era um sabor inigualável, muito embora minha avó enchesse
de defeitos. Para os netos ela fazia arroz com salsichas e ovos, depois da
piscina, nas férias, e eles até hoje acreditam que ninguém prepara melhor este à la minuta .
O melhor tempero é o afeto e a melhor
refeição é aquela que acontece num contexto de harmonia e carinho.
Quero cozinhar muito para os meus
netos, porque os meus filhos certamente já têm seus pratos-recordação, uma vez
que cozinhei muito para eles e sempre procurei fazer das refeições um momento
de encontro, de troca de ideias, com eles elogiando cada prato, interessados
nos ingredientes, alguns manifestando vontade de aprender, outros só de comer
mesmo.
E você? Qual seu prato preferido?
Quando comia? Onde? Quem preparava?
Tente lembrar e verá como a memória dá
um salto e, por uns momentos, você se verá novamente pequeno, naquela situação
onde o alimento lhe foi oferecido. É uma boa sensação, acredite!
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