quinta-feira, 21 de maio de 2015

CLASSE MÉDIA NA VEIA!





                     Nunca fui rica, nem pobre. Nem famosa, nem anônima. Nem bonita, nem feia. Nem gênio, nem burra.

                     Na minha cidadezinha, frequentei os melhores clubes, as melhores festas e até julguei ser mais abonada do que efetivamente era. Circulava com naturalidade em todas as rodas sociais, pertencia ao Lions Clube, declamava em todas as festas, tocava piano em recitais, minha avó, muito vaidosa, me enchia de roupas e enfeites, enfim, quando me dei conta que pertencia à classe média já era professora em outro estado.

                      Por contingência da profissão do marido conheci gente importante e descobri que, a não ser que as pessoas tivessem um toque de classe recheado de educação e cultura, aquela afetação vazia, aquele excesso de requinte e de trejeitos me incomodava.

                     Pela minha profissão, conheci gente muito simples, casas pobres onde fui muito bem recebida, olhares francos, sorrisos sinceros, abraços apertados. Outros, no entanto, me desagradaram muito em função da falta de compostura, das escatologias, do palavreado chulo.

                    Entre esses dois extremos descobri que estava mais uma vez no meio, valorizando acima de tudo a educação, a honestidade, a sinceridade, a cultura, independente de raça, credo, conta bancária, ou outros pormenores sem importância para mim.

                    Por ser oriunda de uma família onde todos sempre trabalharam, mesmo sem maiores inclinações políticas, simpatizei com o partido dos trabalhadores. Por conta disso,  tomar conhecimento do enriquecimento vertiginoso e ilícito dos seus líderes me causou profunda decepção.

                   Ao mesmo tempo em que sinto pavor da violência das favelas, com as leis do tráfico corrompendo tudo, as armas e drogas proliferando em cada viela, também desprezo os filhinhos de papai, que recebem tudo de mão beijada e saem arrotando, se julgando melhor que os outros, esnobando com o que não se esforçaram para merecer, dando carteiraços.

                  Não consigo me alinhar com quem possui muito dinheiro, muitos bens, muitas chances na vida e quase nada de recheio, ou de solidariedade.

                   Tampouco compactuo com aqueles que despejam dez filhos no mundo e seguem transando na frente deles, ou os obrigando a esmolar, ensinando a roubar e a matar para conseguirem o que querem.

                    Sou da classe que acorda cedo, que estuda, trabalha e só dá o passo do tamanho da sua perna.

                     Repudio esses políticos corruptos que acabam todos no mesmo barco, cuidando para que ninguém se afogue e que a classe não perca suas benesses. Lamento pelos pobres diabos que abrem mão de suas amizades para defender o partido X ou Y, cujos integrantes têm como finalidade primeira garantir seu bem bom, pouco se importando com os trabalhadores de verdade.

                     Morro de pena de ver pessoas na chuva catando latinhas.

                     Morro de desprezo por quem faz festas faraônicas e nega um bom dia ao porteiro.

                    Pertenço mesmo à classe média, aquela que é obrigada a declarar o Imposto de Renda, mas recebe restituição. Aquela que obriga seus filhos a estudar, ensina solidariedade, justiça, honestidade, cidadania e luta contra os apelos do mundo que negam tudo isso.

                     Minha classe não tem carros blindados, segurança, vigia, alarmes e se segura na Fé para proteger sua família. Está mais à mercê da violência e não se sente segura em lugar algum.

                    A classe média brasileira é a que mais trabalha, proporcionalmente mais paga impostos e a que primeiro sofre as consequências dos desajustes econômicos e das leis mal feitas do país.

                   É também a classe que mais sofre ao ver a miséria das pessoas famintas e doentes e tenta ajudar.

                   É na classe média que o livro tem mais serventia, ensinando, divertindo, empolgando, fazendo o espírito realizar todas as viagens que seu salário minguado não pode pagar.

                   Agora tenho certeza: sou classe média na veia mesmo!






Um comentário:

Derli Baltasar Castagna Paim disse...

Parabéns, pelo seu texto criativo e atual. Você, mais uma vez, foi feliz em abordar assuntos palpitantes do momento brasileiro. Abraços.