terça-feira, 14 de janeiro de 2014

DESGASTE ANTI-NATURAL



Parece que, na vida, temos que nos conformar com tudo, até com o que nos parece injusto, pela simples razão de que muitas coisas independem da nossa vontade, do nosso empenho e não há outro jeito senão aceitá-las.

As pessoas talentosas para as letras e com mais idade são pródigas em criar cartilhas e poemas de aceitação e até louvação da passagem do tempo, como se envelhecer fosse uma dádiva e a decrepitude física uma bênção.

Tive amigas lindas na juventude! Hoje, salvo raríssimas exceções, estão todas com sobrepeso, rugas e dores musculares.

Nossa redenção sempre se pautou na juventude e vigor dos filhos, que já apresentam fios prateados nas têmporas e perderam um pouco do tônus muscular dos anos dourados.

Agora é a pele de pêssego dos netos que nos encanta e consola, que desvia nosso olhar das manchas do sol nas mãos, do novo formato dos pés, da falta de viço da face, do envelhecimento dos cabelos.

Meus cabelos sempre foram problemáticos. Eu os herdei de uma avó que adorava, mas me deram muito trabalho na vida, sempre crespos, volumosos, rebeldes. Como possuía vários outros atributos físicos compensadores, eu os tolerava bem, sempre alisados e depois com escovas progressivas e chapinha. Pois até eles resolveram se rebelar. Cansados de tantas químicas e puxões, decidiram se suicidar e, para não perdê-los, fui obrigada a aceitar os cachos e ondas teimosas com que nasci e dos quais nem tinha mais lembrança. Quando me acordo e vou lavar o rosto, parece ver uma estranha no espelho, com aquela cabeleira crespa e revolta que eu não via desde os doze anos de idade, quando a alisei pela primeira vez. Parece besteira, mas chega a dar uma crise de identidade numa pessoa, podem acreditar!

Recapitulando, as “maravilhas” da terceira idade (ops, melhor idade): vários quilos a mais e mal distribuídos, cabelos “ao natural” (no meu caso, naturalmente feios), pele sem viço, manchas nas mãos, dores musculares (e eu que nem sabia que tinha quadril e joelho), insônia, preferência pelo travesseiro ao invés do babydoll, visão diminuída (óculos para tudo), aversão a fotografias “de perto”, depressão ao rever fotografias de tempos atrás e uma cabeça teimosa, que insiste em permanecer jovem, disposta, criativa, sonhadora e, às vezes, até romântica.

É bom não precisar mais consultar as receitas e cozinhar cada vez melhor, é maravilhoso reunir a família e encher de mimos os pequeninos, não ter mais patrão, nem horários rígidos a cumprir também é bacana, mas não é disso que se trata esse texto. Falamos em desgastes físicos, inerentes à passagem do tempo, irreversíveis por meios naturais e nem por isso mais suportáveis.

Bom, vou colocar um maiô (e eu adorava usar biquínis bem pequenos), prender esses cabelos teimosos do jeito que der e caminhar à beira-mar, conformando-me com pessoas em pior estampa e, para não ser injusta, agradecendo a Deus pela saúde, pela brisa do mar, pela areia fofinha e por ter olhos para apreciar as maiores e mais perenes belezas, que são as naturais.
 
 

 

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