segunda-feira, 23 de março de 2020

SOBREVIVENTES


Março de 2020.
O Brasil parou.
O mundo parou.
Ruas desertas gritam em silêncio.
O ar se tornou mais puro, livre dos gases tóxicos das fábricas, dos ônibus e dos automóveis.
Os pontos turísticos europeus são como espectros silenciosos e vazios. Até a Monalisa relaxou o olhar, piscou e mostrou os dentes. As gôndolas tiraram um cochilo preguiçoso e a Torre Eiffel bocejou entediada.
No Brasil o povo teve que ser corrido das praias pela polícia, porque não é acostumado a acatar ordens, quanto mais recomendações.
Acostumados a um entre e sai constante, de repente as famílias foram obrigadas a se encontrar e a conviver. Sair de casa virou infração gravíssima, passível de punição e olhares acusadores.
Produtos estranhos são caçados como tesouros nas prateleiras dos supermercados. Quilômetros de papel higiênico e uma quantidade imensurável de garrafas de álcool gel. Curioso é que o sabão de pedra, poderoso contra os germes, nem foi tão cobiçado.
Eis que chegou o Outono, oferecendo seu vento mais fresco, suas manhãs claras e o povo nem viu. Presos em casa, de olho nas notícias catastróficas da TV, ou mergulhadas em intermináveis séries, as pessoas criaram um mundo à parte, sem tempo para saborear a melhor das estações do ano.
Domingo de Ramos, Semana Santa, Páscoa... num país tão cristão essas comemorações passarão em branco, uma vez que até as missas e cultos estão sendo transmitidos pela televisão.
Como estarão as crianças nesses dias e noites silenciosos, sem escola? Pelo menos estão vendo mais os pais, convivendo mais com eles, esperamos que não estejam apenas conectados às redes sociais. Mais brincadeiras, mais carinhos, talvez mais palmadas e castigos. Vai saber! Pelo menos devem sair mais doces, mais gostosuras e muito mais risadas!
Aniversários, casamentos, festas, shows, viagens, passeios, tudo cancelado! Por tempo indeterminado. Azar de quem comprou passagens e terá sempre prejuízo. Agências de viagens, companhias aéreas, hotéis e todo tipo de passeio turístico estarão decretando falência se isso perdurar.
O país vai falir. Com o comércio e a indústria parados, com todo mundo preso em casa, não tem como a economia continuar girando. Sem arrecadação ninguém consegue pagar ninguém.
O que foi que aconteceu?
Como se originou essa pandemia? Sim, epidemias no mundo todo formam uma pandemia.
Um vírus surgido num país comunista é ainda mais devastador, porque as informações são sonegadas, escondidas até o ponto em que já não é mais possível encobri-las. E aí já é tarde demais!
Um mercado de animais vivos, na China, oferecidos para consumo, entre eles cobras e morcegos parece ter originado essa terrível pandemia. Quase um genocídio se contabilizarmos o número de vítimas, isso que ainda está bem no começo e que o inverno nem chegou por aqui.
Um vírus do tipo corona originou essa terrível COVID-19, que optou por exterminar os idosos da face da terra e agora ainda sofre mutação e começa a atingir jovens e até crianças.
Além de ameaçados, os avós sofrem pelo distanciamento dos netos – aquelas pílulas de vida e energia que fazem com que a terceira idade se torne um pouco mais suportável. Confinados, precisam abdicar da presença dos mais jovens da família, como se seus queridos pudessem lhes trazer a doença e a morte. Uma crueldade absoluta!
Ninguém trabalha, todos são potencialmente transmissores e a legião de desempregados e devedores sobe a níveis estratosféricos. A economia fica estagnada e as bolsas de valores quebram no mundo todo.
Nada de visitas, nem beijos, nem abraços, o ser humano tem receio de qualquer outro a menos de dois metros de distância.
As mãos ficam ásperas de tanto sabão e desinfetante, o corpo dolorido pela falta de exercícios e avantajado por esse eterno comer e dormir.
A programação da TV só fala nesse assunto de coronavírus, doença e morte, contabilizando mortos e infectados em todos os países, noite e dia, diariamente. E o mundo chora com a Itália, suas belezas, sua história, seu povo alegre e acolhedor sendo dizimado por essa doença.
Difícil se concentrar no que quer que seja quando imaginamos uma espada afiada sobre a nossa cabeça e das pessoas que amamos.
Os profissionais da saúde se arriscam noite e dia comprometendo, inclusive, a saúde dos seus filhos e das pessoas que convivem com eles, além deles próprios. Já são muitos médicos e enfermeiros infectados e muitos morreram.
Não há vacina, nem remédio para esse vírus até agora. Só depois que muitos mais morrerem. Morte sofrida, cruel, por falta de ar e solidão nos isolamentos das UTIs.
Será esse um novo Dilúvio? Cadê a Arca de Noé? Quem será o Noé da atualidade? A quem ele salvará?
O Outono chegou... com sol, vento e silêncio. Um silêncio ensurdecedor.
Nem o consolo dos templos se pode ter... os santos dormem nos altares com as portas fechadas.
Até o mar está proibido.
Cada pessoa é uma ameaça.
Nunca pensamos em vivenciar mais isso, além de tudo o que já fomos obrigados a engolir.
Quem sobreviverá?
Quantos chorarão?
A vida... a leveza, o sorriso, o aconchego, o cansaço bom, o futuro, os planos, os sonhos... tudo adiado, na melhor das hipóteses.
Até os pássaros estão calados.
Deus, cuida do teu povo! Protege as criancinhas e seus pais. Não deixa os avós sofrerem.
Já foi suficiente para repensarmos, redimensionarmos, separarmos o joio do trigo. Agora, já podemos voltar a viver.
De outra maneira.


2 comentários:

Francisco Carlos D'Andrea (francari) disse...

1º Cavaleiro do Apocalípse de São João Evengelista: A PESTE.

Juçara Macedo Moro disse...

Amiga escritora , seu texto de uma verdade difícil de aceitar, mas real, avassaladora, batendo em todas as portas, dormindo e acordando conosco, quem dera fosse um pesadelo, mas acordo todo dia com a certeza que tudo está a nossa espreita. Continuo lendo seus textos e me surpreendendo sempre. Obrigada pela boa leitura , que Deus a ilumine !