quinta-feira, 14 de julho de 2016

Prefácio do GAZETEANDO (2007).



PREFÁCIO

O jornalismo me ensinou a perseguir a impessoalidade, trabalhar a emoção, mas para contar a história dos outros, a equilibrar-se para não cair no precipício do simulacro. A rolar na terra, a sujar as mãos de sangue, mas sempre como se não fosse você, olhos arregalados, à beira do despenhadeiro, a ver lá embaixo o filete de água, o caminho da vida, o reflexo das estrelas.
Maria Luiza é o meu olhar feminino, o meu lado sincero, a coragem de abrir seu próprio coração, revelar sentimentos, frustrações, saudades, amores, momentos de júbilo, indignação. O mundo a girar ao seu redor, as amizades, a família.
Todas as reflexões de Maria Luiza, corporificadas em crônicas, sofrem a influência das sombras e luzes de um velho casarão da Mariz e Barros, em Alegrete - RS, comprado pelo nosso avô num gesto de benevolência. Já estava fechando um negócio para adquirir um outro prédio, na mesma rua, na esquina da Praça Getúlio Vargas , quando uma senhora desesperada entrou na cartório onde ele trabalhava. Contou que seu marido estava mergulhado em dívidas e pensava em se matar. Sua única salvação era vender a casa.
– Eu soube que o senhor está procurando uma casa para comprar - disse a mulher.
– É, o Cartório precisa se mudar e eu gostaria de mantê-lo na mesma rua – admitiu Eduardo Vargas.
– A casa fica ali, ao lado da residência do senhor Lúcio Assumpção - ela explicou.
– Eu sei – o nosso avô balançou a cabeça. E a comprou naquele mesmo dia por 12 contos, era o ano de 1927.
Passaram-se 80 anos. A nossa mãe era uma menina e o casarão continua uma referência para ela e para nós.
Nas crônicas de Maria Luiza há sempre o sopro desta casa. O orgulho pelo avô, a adoração pelo pai, a fixação na avó, o carinho pela mãe. Suas paredes largas, com tijolos assentados com barro, lhe ensinaram o amor à família. A proteção e o orgulho pelos filhos.
Mesmo à beira-mar, em Florianópolis, ela vai se lembrar de seu teto alto, do fogo na lareira, das fotos espalhadas por tudo, dos tempos de colégio, das professoras; revoltar-se com o descaso para com o magistério, criticar políticos.
Aproveite para ler dentro de um coração. A minha irmã mostra.  


                                            TIBÉRIO VARGAS RAMOS*

*Professor do curso de Jornalismo da PUCRS.


Um comentário:

Francisco Carlos D'Andrea (francari) disse...

Gosto da capacidade que o Tibério tem de mudar entre os estilos de jornalista e de cronista, conforme se faz necessário, sempre com muita propriedade.