Em seis décadas de vida não me recordo de tempos
politicamente tão conturbados como este que vivemos no Brasil. É bem verdade
que em 64, na época da Ditadura Militar, eu ainda só pensava em bonecas e
patinetes. Mas na minha casa não se falava em ódio, nem se via na TV (que nós
nem tínhamos) revoltas, saques, depredações. Redes sociais, então, seria coisa
para os Jetsons! E olha que pertenço a uma família de gente engajada na
política, tendo um avô Prefeito e um tio Vereador, daqueles com montanhas de
votos. Meu pai era da UDN e minha mãe do PTB. Na casa do meu avô o PTB fazia
reuniões políticas que meu pai aguardava terminarem tomando chimarrão e fumando
palheiro no pátio. Na saída, todos se cumprimentavam, numa cordialidade e
respeito absolutos. Meu avô saiu mais pobre da prefeitura do que entrou, pois
deixou de trabalhar no seu Cartório para atender os problemas da comunidade.
Meu pai cansou de colocar gasolina nos aviões do Aeroclube do seu próprio
bolso, para que os alunos não perdessem as aulas. Não tínhamos carro (meu pai
só tinha um avião) e íamos para a escola a pé, às vezes debaixo de temporais,
porque meu pai jamais usaria a caminhonete do Aeroclube para fins particulares.
Naquele tempo, a gente nem questionava isso, achava normal. Hoje é que eu comparo
e dou ainda mais valor à retidão de caráter dos políticos daquela época em
geral e do meu pai e do meu avô em particular.
A mídia é responsável por quase tudo que sabemos e
discutimos hoje em dia. Se não fosse pelos meios de comunicação, continuaríamos
caminhando de olhos vendados rumo ao precipício. Nunca o jornalismo político
esteve tanto em evidência e preocupa o fato de que, caso as manchetes de capa
não tratem dos assuntos mais polêmicos da política nacional, dificilmente
alguém se interessará em comprar aquele periódico, ou aquela revista. Os
cadernos de cultura servem pra enrolar peixe e banana e as matérias sobre
assuntos outros são imediatamente deixadas de lado. Não é preciso ser político
para entender que, com a desvalorização do magistério (só bons salários
valorizam o professor), os alunos não apreciam a cultura, não descobrem o
prazer da leitura, não se interessam pelas artes. O professor também é carente
desse conhecimento, não teve tempo ou aptidão para se aprimorar e alguns
escolheram o magistério apenas porque era o curso mais fácil de ser aprovado no
vestibular. Sabendo quanto irão receber e o trabalho árduo que precisarão
desempenhar, muitos professores verdadeiramente vocacionados debandam para
outras áreas e o ensino fica cada vez pior, as Feiras do Livro dão pena,
vendendo apenas livretos mal traduzidos a preços irrisórios (já que produzidos
aos milhares), com conteúdo zero.
As pessoas, nesses tempos, ingressam num redemoinho de informações,
de acusações, de mentiras e desmentidos que as envolvem completamente, subtraindo-as
de seu lazer, incompatibilizando-as com os amigos, deixando de lado
compromissos que antes as satisfaziam e até com prejuízo do convívio familiar,
num afã de provar que seus argumentos estão certos, como se dependesse delas a
salvação do país.
Tudo passa. Esse tempo também passará. Resta saber o que, na
fina peneira do tempo, irá restar de toda essa briga, quem serão os heróis e os
vilões no registro da história e que benefícios e malefícios advieram ao povo.
Enquanto isso, bom seria que os ventos outonais soprassem
com mais frescor, levando as folhas secas e os males feitos para longe e
deixando o povo brasileiro lagartear ao sol do meio dia, descongelando os ossos
e saudando os amigos.
Oxalá.
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