Dizem que amor nunca é demais. Será mesmo? Ou amor demais
pode sufocar? Acontece com os humanos e também com os animais.
O dono era um homem alto e corpulento. O cão um poodle
médio, preto e com alguns fios brancos nas orelhas.
Na primeira hora do dia, quando donos e cachorros fazem seu
trottoir pela calçada em frente, preparando-se para passarem o dia todo
sozinhos num apartamento à espera do passeio da noite, uma cena me chamou a
atenção.
Eles chegaram num carro preto, fato já inusitado, pois sair
de carro para defecar em outra rua, ao invés de usarem o passeio próximo à sua
casa, causa estranheza. O homem com o cãozinho ao colo, manobrando o carro,
como se o animal fosse seu copiloto e como muitos pais fazem com os filhos
pequenos.
Ao invés de colocar a guia no cachorro e sair a caminhar com
ele, como é de costume, ele passeava com o cachorrinho ao colo e, de vez em
quando, o largava um pouquinho no chão para ver se ele fazia suas necessidades.
Nesses momentos, percebi que o cão era perfeito, podia caminhar e ficava com
olhos tristes e orelhas murchas cada vez que o dono o recolhia do chão.
Um excesso de alisar, de apertar e o cãozinho de olho
espichado para os outros cães, que saltitavam à frente dos donos, corriam,
cheiravam o que deviam e o que não deviam, eram cães e não bebês de colo.
Minutos depois, com seu cão bem apertado debaixo do braço, o
homem retornou ao carro, sentou ao volante outra vez com o cão no colo e partiu,
deixando como última visão o olhar comprido e triste do cãozinho para a minha
schnauzer, que se requebrava diante do portão, apostando corrida com o lhasa apso
do vizinho.
A carência afetiva do dono certamente cerceava seu animal,
imagino que nem em casa o bichinho tenha sossego e precise servir de consolo o
tempo inteiro para um dono incapaz de cativar os seus iguais.
Nesse caso, amor pode ser demais sim e quase tão nocivo
quanto o desamor, uma vez que tolhe, cerceia, inibe, como água ou sol demais
numa planta.
O segredo, para tudo,
é a medida.
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