quarta-feira, 9 de julho de 2014

E FOI PAPADO NESSA BRASIL !



Escrevi este texto na Copa de 1990. Foi publicado na Gazeta de Alegrete. Mudou bem pouco .


Que mistério verde-amarelo é esse que faz os brasileiros esquecerem de tudo, do salário super-mínimo, da poupancinha de uma vida confiscada e sacrificarem até o pãozinho de cada dia pra comprar uma bandeirinha e meia dúzia de bombas, a fim de comemorar o bicho dos seus 22 jogadores convocados? Só convocados porque, entre mortos e feridos, lesionados e limitados, sobraram bem poucos.
Cinco gaúchos que, modéstia à parte, desempenharam bem suas funções e um técnico metido a gaúcho nas suas arbitrariedades, mas nada rio-grandense nas decisões e cobranças de garra da sua equipe. Renato gaúcho que, apesar de todos os defeitos apontados,  esbanja valentia em campo foi aproveitado cinco minutos nessa pré-estreia brasileira na Copa.
Mesmo sem acreditar nessa seleção e com mil restrições a esse técnico, quando entravam os canarinhos  no gramado disparavam os corações. Parece que o Ouvirandu e as cores verde-amarelas acionavam o botão da adrenalina dos mais indiferentes torcedores. Nesse momento, esqueciam-se as profissões, os títulos, o saldo bancário, o sexo, a idade, TUDO -  eram todos brasileiros! Mesmo quem torcia contra, para que o futebol não se transformasse no ópio do povo e para que os 100 dias do Plano Brasil Novo não se fingissem de mágicos, mesmo esses brasileiros mais conscientes perdiam o  apetite, roíam  unhas ... e choraram no triste final.
Perder faz parte do esporte - mas não pra a Argentina! Seria  o mesmo que Alegrete perder para Uruguaiana , Santa Catarina para o Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro para São Paulo e por aí afora nessas rivalidades até compreensíveis num país de dimensões continentais. O pior é que o Brasil não perdeu pra Argentina, perdeu para o Maradona e já não temos nenhum Pelé.
Isso nos força a pensar que o Brasil é um inventor. Ele inventa o futebol, inventa a lambada, mas, quando exporta suas invenções, acaba sempre ultrapassado por seus seguidores. A verdade é que hoje a Europa sabe até ensinar futebol ao Brasil, assim como a lambada já deve estar sendo melhor dançada na França do que aqui. Além disso, que triste festival de coices, cotoveladas e fintas no futebol sul-americano! Parece que nossos jogadores esqueceram as normas mais básicas do futebol e só pensam em agredir, parar a qualquer preço as jogadas que não souberam, com tática e técnica, evitar.
Isso nos leva a concluir que, neste final de século, está provado que futebol não é, nem nunca foi, porrada, mas aprimoramento técnico-esportivo. Por que não Jogar? Jogar licitamente e com arte, ao invés de atacar e defender com solas e cotovelos? Certamente não foi essa a escola que nos legaram Pelé, Garrincha, Tostão, Rivelino, Gérson, Clodoaldo, Zico, Falcão e tantos outros craques brasileiros.
A seleção de Camarões talvez constitua, nessa Copa,  um exemplo a ser seguido. Sem profissionalismo, sem salários astronômicos, combatem noventa minutos acirradamente pelas cores da camisa que vestem.
De que nos valeram tantos bichos, tantos passes vendidos para a Europa se, na hora de mostrar garra, patriotismo, amor à sua bandeira ... só os 140 milhões de torcedores sofreram, gritaram e choraram por mais uma vez que paparam o Brasil ?


 1990.







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