Escrevi este texto na Copa de 1990. Foi publicado na Gazeta de Alegrete. Mudou bem pouco .
Que mistério verde-amarelo é esse que
faz os brasileiros esquecerem de tudo, do salário super-mínimo, da poupancinha
de uma vida confiscada e sacrificarem até o pãozinho de cada dia pra comprar
uma bandeirinha e meia dúzia de bombas, a fim de comemorar o bicho dos seus 22 jogadores convocados?
Só convocados porque, entre mortos e feridos, lesionados e limitados, sobraram
bem poucos.
Cinco gaúchos que, modéstia à parte,
desempenharam bem suas funções e um técnico metido
a gaúcho nas suas arbitrariedades, mas nada rio-grandense nas decisões e
cobranças de garra da sua equipe.
Renato gaúcho que, apesar de todos os defeitos apontados, esbanja valentia em campo foi aproveitado
cinco minutos nessa pré-estreia brasileira na Copa.
Mesmo sem acreditar nessa seleção e com
mil restrições a esse técnico, quando entravam os canarinhos no gramado
disparavam os corações. Parece que o Ouvirandu
e as cores verde-amarelas acionavam o botão da adrenalina dos mais indiferentes
torcedores. Nesse momento, esqueciam-se as profissões, os títulos, o saldo
bancário, o sexo, a idade, TUDO - eram
todos brasileiros! Mesmo quem torcia contra, para que o futebol não se
transformasse no ópio do povo e para
que os 100 dias do Plano Brasil Novo não se fingissem de mágicos, mesmo esses
brasileiros mais conscientes perdiam o
apetite, roíam unhas ... e
choraram no triste final.
Perder faz parte do esporte - mas não
pra a Argentina! Seria o mesmo que
Alegrete perder para Uruguaiana , Santa Catarina para o Rio Grande do Sul, Rio
de Janeiro para São Paulo e por aí afora nessas rivalidades até compreensíveis
num país de dimensões continentais. O pior é que o Brasil não perdeu pra
Argentina, perdeu para o Maradona e já não temos nenhum Pelé.
Isso nos força a pensar que o Brasil é
um inventor. Ele inventa o futebol,
inventa a lambada, mas, quando exporta suas invenções, acaba sempre
ultrapassado por seus seguidores. A verdade é que hoje a Europa sabe até
ensinar futebol ao Brasil, assim como a lambada já deve estar sendo melhor
dançada na França do que aqui. Além disso, que triste festival de coices, cotoveladas e fintas no futebol
sul-americano! Parece que nossos jogadores esqueceram as normas mais básicas do
futebol e só pensam em agredir, parar a qualquer preço as jogadas que não
souberam, com tática e técnica, evitar.
Isso nos leva a concluir que, neste
final de século, está provado que futebol não é, nem nunca foi, porrada, mas aprimoramento
técnico-esportivo. Por que não Jogar?
Jogar licitamente e com arte, ao invés de atacar e defender com solas e
cotovelos? Certamente não foi essa a escola que nos legaram Pelé, Garrincha,
Tostão, Rivelino, Gérson, Clodoaldo, Zico, Falcão e tantos outros craques
brasileiros.
A seleção de Camarões talvez constitua,
nessa Copa, um exemplo a ser seguido.
Sem profissionalismo, sem salários astronômicos, combatem noventa minutos
acirradamente pelas cores da camisa que vestem.
De que nos valeram tantos bichos, tantos passes vendidos para a
Europa se, na hora de mostrar garra, patriotismo, amor à sua bandeira ... só os
140 milhões de torcedores sofreram, gritaram e choraram por mais uma vez que paparam
o Brasil ?
1990.
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