quarta-feira, 23 de outubro de 2013

TEM CERTOS DIAS...

Esta crônica conseguiu o 1º lugar  no Concurso Literário "Professor Mário Clímaco"  da Academia de Letras, Ciências e Artes de Ponte Nova - MG - ALEPON




             Não é o dia da semana que conta, muito embora as segundas-feiras sejam acusadas de todo tipo de pessimismo ou depressão. Para quem já se aposentou do trabalho, o início de mais uma semana difere pouco dos demais dias. Talvez a véspera, os programas de TV, o que se leu nos jornais, o capítulo do livro, o que o padre falou no sermão, os sonhos da noite, o encontro matinal com o espelho usando óculos, tudo contribui, enfim, para que, sem aviso prévio, baixe uma nostalgia crescente, avassaladora. E ficamos tentando sacudir a poeira dos maus pensamentos da mesma maneira que os animais fazem para tirar a água do corpo.
             Dá vontade de gritar para todos os jovens de pele macia, cabelos sedosos, carnes firmes para que se valorizem, aproveitem cada segundo dessa plenitude ao invés de viverem se destruindo, estorricando ao sol, bebendo até lesar o fígado, isso quando não se metem em vícios ainda piores e mais destrutivos.
              Houve um tempo em que as agruras da vida consistiam em ter muita matéria para estudar, trabalhos escolares para fazer, pesquisas imensas para copiar. Uma época em que tragédia era ter que apresentar em casa uma nota baixa, ou uma chegada tardia na escola.
             Depois, difícil era passar algumas noites em claro com um bebê fazendo manha, ou apartar briga dos filhos pequenos, ou ainda preparar muitas mamadeiras e papinhas.
             Mais tarde, a espera dos filhos adolescentes depois das festas começou a demonstrar que existem coisas muito mais sérias e piores na vida, como a ansiedade até encontrar o nome deles na lista dos aprovados no vestibular.
            De uma hora para outra nos sentimos no auge, atingimos a plenitude física e emocional e a vida faz todo o sentido, com o coroamento de nossas batalhas pessoais e profissionais.       
             Estufamos o peito, alargamos o olhar e nosso sorriso é de triunfo. Permanecemos assim por algum tempo, usufruindo da farta colheita de tudo o que semeamos até então. Acariciamos a prole e nos reconhecemos em cada novo ser que adentra ao nosso clã familiar.
             No momento seguinte, a vida se encarrega de nos apontar a escada para a descida.      Relutamos, há quem tente driblar o inexorável com mil e uma artimanhas ineficazes; no entanto, todos descerão por ela, ou sucumbirão entre os degraus.
            As marcas do tempo ficam tatuadas no rosto, no corpo, nos cabelos, inclusive no coração, bombardeado pelas emoções da existência.
             Há que se ter dignidade para representar o último ato. Os arrependimentos, maiores ou menores, nos acompanharão, mas a vida não dá outra chance. Foi assim porque tinha que ser, ou porque nós mesmos escolhemos esse ou aquele caminho.
             Enquanto há vida há esperança e o sol continua nascendo para todos. Ocupando o lugar que nos cabe, na etapa certa da caminhada, as frustrações serão menores e as comparações menos cruéis.
            Se recordar também é viver, basta fechar os olhos e deixar que a memória nos transporte exatamente para aquele ponto em que ainda tínhamos um mundo para desbravar, espalhávamos pujança pelas ruas da cidade e nem sonhávamos que, um dia, iríamos sentir saudades e querer eternizar aqueles momentos.
             E assim eu os deixo, prontos para refletir e relembrar.


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