sexta-feira, 12 de abril de 2013

MEMÓRIA



Não adianta negar, ela (a memória) já não é a mesma.
Nem sei bem se por talento ou imposição, já que ficava muito nervosa interiormente, fui por muitos anos a declamadora oficial do IEOA (meu colégio). Era só chegar alguma autoridade, ou nas datas comemorativas, enfim, fosse o evento que fosse lá vinha uma poesia enorme para eu decorar.
Com nove anos me fizeram  declamar "Meus oito anos" de Casemiro de Abreu . Imaginem a “emoção” ( que saudade eu poderia sentir?)!
 Aos dez já me brindaram com “Vozes d'África", de Castro Alves e dois anos depois  sofri e fiquei muito de castigo para decorar "Navio Negreiro", do mesmo autor. Cada uma com mais de vinte estrofes de doze versos cada uma. E rimadas, portanto, sem margem de erro! Pois dona Conceição conseguia! E minha pobre cabeça de criança, num corpo franzino, repetia cada linha com seu gesto ensaiado.
Com onze fui incumbida de recitar as "Cirandas" de Mário Quintana para ele próprio, com o orfeão “Carlos Barone” cantando ao fundo, num festival de canto orfeônico, em Porto Alegre. Quando nos apresentamos já era tão tarde e eu era tão pequena que, ao final, ele me pegou no colo para agradecer a homenagem, comovido com o meu cansaço.
     Na faculdade tive meu primeiro "branco", ao apagar completamente o discurso que faria para o Ministro da Educação (Jarbas Passarinho), diante da filha de Ruy Ramos. Meu professor de latim, que era também psicólogo e padre, me fez tomar uns goles de uísque puro (que iam servir aos homenageados) e, com o ajuda dos Céus e da bebida, comecei improvisando e, aos poucos, o texto foi retornando à minha memória.
 Não me poupavam mesmo, imaginem que fui oradora da minha turma de Letras quando estava grávida de sete meses! Sem falar nas partituras imensas que precisava decorar para as audições de piano.
Pois é, hoje já me sinto mais desmemoriada, ou, pelo menos, com uma memória mais seletiva. Não esqueço as coisas realmente importantes, já as triviais, às vezes deixo passar batido.
Sempre fui péssima para decorar títulos de livros, de filmes, de músicas, de novelas. Parece até um bloqueio, pois lembro o enredo todinho, nas primeiras cenas já sei se assisti ao filme ou não, mas do título raramente consigo lembrar. Curiosamente, compilando minhas crônicas de mais de trinta anos para o meu primeiro livro, surpreendi-me ao ver que naquele tempo todo eu não tinha repetido um título sequer, portanto, deve haver um registro em algum lugar.
Claro que vivo me agendando, pois tenho muitas pessoas sob a minha responsabilidade.  Então, escrevo bastante. Mesmo assim, vez por outra alguma coisa me escapa.
Devemos trabalhar a memória, dizem os especialistas, portanto, diminuí agora minhas anotações de coisas a fazer e estou me esforçando para memorizar compromissos e listas de compras.
Só não sei no que vai dar!


2 comentários:

Elisabete Stolarski disse...

Estas é uma de minhas preocupações... procuro sempre exercitar minha memória, seja tentando lembrar números de telefones,nomes de pessoas ... nos bailes eu sempre pergunto o nome de quem costumo conversar, e depois tento lembrar o nome de todos... e olhe que são muitos, pois graças a DEUS tenho muitos amigos de baile. Dizem que fazer palavras cruzadas ajuda, se ajudar estou bem pois adoro palavras cruzadas.

Rita Faraco de Freitas disse...

Fiz um comentário anterior, mas acho que me atrapalhei ao enviar. Vou tentar reproduzi-lo:

Adorei, como sempre, a tua crônica, Maria Luiza. Lendo-a, lembrei de mim quando criança. Fui tua antecessora como declamadora oficial não só do nosso IEOA, mas do Alegrete. Declamei até no altar da Igreja Matriz (As Cinco Estrelas), nas festas do “Divino Coração” (Idade de Ouro, enorme), nas solenidades do “Osvaldo Aranha”, no encerramento de novenas, nas Bodas de Ouro dos meus avós, na Rádio Alegrete e por aí afora. Fui também oradora da turma na formatura do Curso Primário. Uma saia justa inesquecível por conta do meu pai que, possuidor de uma belíssima letra, passou a limpo meu discurso e fez algumas alterações. Só que esqueceu de me avisar... A diferença é que eu detestava fazer isso, mas minha mãe adorava e era incansável nos ensaios das entonações de voz, nas expressões faciais e nos gestos! E eu me achava ridícula! rsrsrs Aos 15 anos me rebelei e me recusei terminantemente a continuar declamando. A essas alturas, já dividia o palco com a Lenira Berquó e a Jussara Monte que assumiram esse encargo com muito brilho. Bem mais tarde, coube a ti essa tarefa! Fiquei até com trauma de falar em público. Problema que precisei resolver na marra para fazer as sustentações orais como Promotora de Justiça da área criminal. Agora, já aposentada, fiz uma faxina da minha sacrificada memória e abri espaço apenas para amenidades. Estou achando o máximo! Até me dou o luxo de esquecer coisas menos importantes sem me preocupar com isso. Acho que mereço esse descanso mental! Um grande abraço alegretense, guriazinha talentosa!