A leitura é um prazer solitário. Egoísta e divino.
Através dela podemos nos ausentar, mesmo que não nos seja permitido dar um
passo. Podemos fazer ouvidos moucos a conversas desinteressantes, suportar
viagens longas ou salas de espera tensas e/ou atrasadas. Lendo viajamos,
sofremos, deliramos, conhecemos... com o corpo relegado ao plano secundário que
lhe cabe por direito e deixando o espírito flanar. Sinto pena de quem ainda não
descobriu os prazeres inenarráveis de um bom livro.
A escritura também não é compartilhada e, quase
sempre, traz um ônus pesado ao escritor. Quantos mestres das letras se
dissolveram nos vícios e orgias literárias perseguindo suas musas! Os
românticos não concebiam poemas que não fossem encharcados no absinto. E
morriam cedo demais, deixando obras eternas, incapazes muitas vezes de serem
igualadas por escritores longevos. Seria genialidade? Atmosfera propícia à
manifestação do gênio, ou Liberdade? Parece que suas cabeças talentosas faziam
um pacto cruel com o destino, permitindo-se implodir, romper com todas as
amarras da mediocridade, trocando vida e saúde por uma obra prima.
Hoje, a maioria dos escritores tem horário de
funcionário público para escrever, frequenta academia, bebe energéticos ao lado
do computador.
Será que Graciliano Ramos escreveria da mesma forma
sem a pura cachaça nordestina e seus incontáveis cigarros? Poderia sua alma de
homem reservado romper os grilhões e criar “Angústia” sem o auxílio de seus
vícios?
E Nelson Rodrigues, de vida e obra tão trágicas (mesmo
nas crônicas de costumes há muita tragédia embutida), conseguiria suportar suas
mazelas e transformá-las em romances, peças teatrais, crônicas sem o auxílio da
muleta que o cigarro representava?
João Ubaldo, de dedos manchados e cinzeiros cheios ao
lado da máquina de escrever, hoje é outro homem, outro escritor, livre do
tabagismo. Melhor como gente, só não sabemos ainda como contador de histórias.
O fato é que vidas certinhas não dão uma boa história
e a rotina sufocante dos dias iguais, ruídos iguais, pessoas iguais não permite
o alçar de grandes vôos. O simples fato de se pensar “para quem” escrevemos, ou
“quem” irá nos ler já mutila a criatividade, numa pré-censura empobrecedora.
O escritor precisa ser livre, ter o direito de dizer
as coisas como pensa ou inventou sem interferências externas. Quem gostar
gostou e quem não gostar que procure outra coisa para ler.
Somos todos muito diferentes. Nem filhos da mesma
“ninhada” saem iguais. É claro que alguns leitores serão nossos fãs, outros nos
detestarão e, o pior de tudo, para muitos seremos indiferentes.
Nada como uma boa leitura, com certeza! Mesmo que o
preço para atingir aquele resultado tenha sido bem alto para o autor.
Tudo na vida tem um preço, na literatura não é
diferente. Muitos gênios das letras sucumbiram dentro da própria genialidade e
nos legaram verdadeiros tesouros. Eternizaram-se neles.
Quem diz que ao ler ou escrever nos isolamos? Aí sim
é que nos sentimos povoados, transportados, postos à prova.
Dói muitas vezes, mas é altamente compensador!
Nenhum comentário:
Postar um comentário