quarta-feira, 3 de abril de 2019

VIAGEM ENLUARADA



“O pensamento parece uma coisa à toa, mas como é que a gente voa quando começa a pensar?”
O grande Lupicínio Rodrigues imortalizou esses versos que retratam uma grande verdade.
Viajamos muito na vida, uns mais, outros menos; registramos lugares, costumes e pessoas em belas fotografias, Diários e mensagens nas redes sociais. Agora, o melhor de tudo não é captado externamente e fica guardado num cantinho da memória, só esperando a invocação certa para se manifestar.
Uma noite de verão, com uma rede no alpendre, uma lua cheia escandalosa pendurada no céu, olhos semicerrados e tem início a melhor das viagens, aquela que vai ao encontro de tudo que mereceu ser guardado na lembrança e que revive naquele mergulho evocado nas melhores recordações.
No momento seguinte já estamos novamente em Paris, caminhando na Champs-Elysées, admirando a cidade-luz de cima da torre Eiffel. Nas Ramblas de Barcelona, nas catedrais, nos museus, nas gôndolas, nos jardins, nas torres, nos portos e aeroportos, nas praias, tudo é sentido perfeitamente no balançar preguiçoso da rede.
O pensamento não precisa ser linear, ignora os calendários e voltamos à infância e às estações de águas termais com toda a família. Os maiôs retrôs, o riso cristalino, as presenças, tudo é revivido nos mais saborosos detalhes e até a temperatura da água nas piscinas roça a pele.
A rede leva a memória às praias nordestinas, aos cordéis, aos sabores picantes, às jangadas, às águas mornas dos “verdes mares bravios da nossa terra”. E navegamos molemente ao som do bolero de Ravel enquanto o sol se põe.
De lá podemos desembarcar na Ásia e maravilhar-nos com a polidez educada do Japão, com a profusão de peixes e bicicletas, com o recato das moças e a beleza de uma cultura preservada além das guerras, tsunamis e vulcões.
Nos livros realizamos as maiores viagens!  Lendo autores russos, africanos, chineses, indianos desbravamos todos os continentes, até onde nossos pés ainda não pisaram, mas que os romances descreveram com tantos detalhes que somos capazes de sentir até o sabor dos pratos e os cheiros das ruas. Acabamos sabendo muito dos costumes, da história dos povos, do clima, através desse meio de transporte fantástico que é o livro. Viagens feitas com conforto e segurança, prazerosas, plenas.
Um cansaço gostoso de tantas lembranças de viagens, um sorriso nos cantos da boca, um suspiro comprido para a lua cheia e o sono vai chegando... no balanço suave da rede vai começando outra viagem, desta vez ao mundo encantado dos sonhos.
Boa viagem!




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