As pessoas gostam de inventar chavões para dourar a pílula e
ludibriar as mazelas, assim como vivem dizendo que cada idade tem a sua beleza.
Mas me digam só: qual é a beleza da velhice? Importância ela tem, mas beleza...
não sei onde. Será nos cabelos ralos e finos da maioria dos homens e de algumas
desafortunadas mulheres? Nos pescoços enrugados dos magros ou com papadas dos
gordos? Nas manchas das mãos? Nos dedos semi tortos dos pés? Nas rugas, ou nas
bochechas inchadas e artificiais do botox? Nas pálpebras que teimam em se
deitar sobre os olhos?
Sei que muitos, a essa altura, já estarão na defensiva
dizendo, “eu não sou assim”. Pois se ainda não é, saiba que um dia será. A
alternativa é pior.
A velhice é feia, tem um cheiro doce meio enjoado, dói o
joelho, doem os pés e a flexibilidade vai embora. Até para vestir a calça ou
amarrar o sapato tem que vir um gemido junto. Nos gordos então...
Lembra quando você subia as escadas correndo, ou corria para
alcançar alguém, muitas vezes até levando uma criança no colo? Esquece. Agora é
aquele caminhar mais lento, mais inseguro, mais pesado.
Tudo que se come à noite pesa no estômago, ou lhe incha como
um balão. Aliás, o aparelho digestivo dos velhos daria para ser usado na
fabricação de vento. Ah, com você não é assim? Que bom! Mas vai ficar. E olha
que estou só descrevendo a velhice saudável. Se fosse abordar as limitações e
deficiências físicas dessa última idade teria que escrever um tratado.
A cabeça, para quem não foi acometido pelo terrível mal de
Alzheimer, continua azeitada, cheia de cultura e de experiência e esse, para
mim, é o único ponto realmente positivo da velhice. A paciência que finalmente
chega, a calma nas situações mais tensas e a sabedoria de viver e deixar viver.
Só para chegar a esse nível vale a pena suportar toda feiura da velhice.
As mulheres foram treinadas desde sempre a disfarçar seus
defeitos e mazelas, a fim de que ninguém percebesse suas limitações. Os homens
já se esforçam menos, achando que é assim mesmo e que não há o que fazer,
acontece com todo mundo. Por isso, veem-se mais mulheres fazendo cirurgias
plásticas, tratamentos estéticos, mil coisas para adiar ao máximo o encontro
cruel com o espelho da vida.
Quando se chega com o espírito em forma na idade da
decadência física, o sentimento mais forte é o da inadaptação. Não nos
reconhecemos naquele rosto e naquele corpo e parece que cristalizamos em nós
uma imagem anterior, bem mais aprazível.
Para quem não aprecia esses tratamentos radicais, ou teme
suas consequências, o jeito é pedir aos fotógrafos que façam a gentileza de se
afastarem sempre um pouquinho mais na hora de baterem suas fotos. Não resolve,
mas dói menos.
E o bálsamo desse final de caminhada são os netos, dando aos
velhos a doce ilusão de eternidade. Neles são depositadas as últimas esperanças
e a eles é devotado todo carinho que sobrou.
Quem tem um companheiro ou companheira, velho também, terá
maior compreensão, embora menos
vitalidade.
Para quem consegue ler e comprar bons perfumes, para quem se
mantém asseado e não se aposenta da vida, ficar velho é um pouco menos pior.
Não adianta dourar a pílula, é assim mesmo. Aquela meia
dúzia de velhos saracoteantes morre de dor nas costas quando deita.
Um comentário:
A melhor descrição da "pior idade inicial", com tendência ou certeza de que irá piorar com o passar do tempo. :D
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