domingo, 9 de fevereiro de 2014

FORMIGAS VIRTUAIS



               Claro que você já andou de avião. Hoje só não anda quem não quer. E, lá de cima, viu o quê? A roupa linda de alguém, as joias, os penteados, os defeitos físicos, a beleza de quem quer que seja? Ou apenas uns pontinhos indecifráveis nas estradas, que deviam ser automóveis, não importa o ano, nem a marca deles?
                Pois é, aquelas formiguinhas anônimas refletem bem nossa importância no Universo. E como fazemos tempestade em copos de água, por qualquer besteira!
                 Aqui, bem ao lado da minha janela havia uma linda casa antiga, com quintal, pomar e até galinheiro. Os pássaros nos acordavam em revoada pela manhã. Depois, os filhos da velhinha venderam a casa e a colocaram abaixo. O sol inundou ainda mais nosso apartamento, pois ficou ao lado apenas um vasto terreno cheio de terra onde os pássaros faziam a festa diuturnamente. Tempos agradáveis aqueles! Dava gosto olhar pelas janelas  ao amanhecer e no entardecer.
                 Depois vieram as máquinas, os homens maus, a serra elétrica e hoje, por exemplo, temos três caminhões de concreto estacionados diante de nossas janelas, num barulho e numa poluição infernais, para que outro formigueiro seja construído, aonde mais formigas irão se amontoar e resolver seus probleminhas de formiga, achando que são os maiores da terra.
                  Assim como nós, formiguinhas virtuais, que estamos aqui, de pijama ou bem aprumados, perfumados ou pedindo um bom banho, escondidos ou loucos pra deixar um bilhetinho, concordando ou achando tudo uma grande bobagem, refletindo sobre o que foi dito, ou simplesmente ignorando, enfim, continuamos as mesmas formigas inexpressivas da construção ao lado, apenas diante de um computador.
                    Para quem deixamos de ser um grão de areia ou uma minúscula formiga? Para quem nos ama, para nossa família, para quem depende de nós, para quem pensa como nós. E só. Para os demais, se não estivermos mascarados ou com alguma coisa muito estapafúrdia, seremos sempre apenas mais um na multidão anônima da vida.
                    Os filhos, os livros e as obras são nossa única esperança de algum sentido nesta passagem pela vida. Sem eles, seremos exatamente iguais ao lindo jardim que havia aqui ao lado e que  agora se transformou numa montoeira de ferro e concreto, onde formigas irão trazer suas caixinhas de tesouro e espalhar pelos quadradinhos achando que conseguiram seu lugar ao sol. Elas nunca viram o jardim, portanto, jamais sentirão falta dele. Tirarão fotos, mandarão às outras formigas, trabalharão muito para pagar seus pedacinhos na grande muralha e dormirão convictas de que o mundo só gira ao redor do seu umbigo.
                    Quem sabe essas formigas não serão muito mais felizes que as outras, aquelas que têm consciência de sua própria insignificância? Não sei. Pode até ser. Só que nem por isso elas, que se julgam tão importantes, terão importância real. Só pensarão que têm. 
Se consola...









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