Ninguém escolhe ser
escritor.
O escritor é sempre
escolhido.
E os que, por
ventura ou desventura, fizerem essa “escolha”, quase que certeiramente não
serão bem sucedidos.
O escritor é um ser
que se alimenta de ideias e se manifesta por letras. Quando não consegue se
expressar, vai ficando sufocado, como se as palavras estrangulassem sua
garganta.
Tido como ermitão,
o escritor precisa de momentos de reclusão e paz, possibilitando que as ideias,
sempre muitas e até contraditórias, se organizem, tornem-se claras, permitam a
transferência do cérebro para os dedos, para a tela, para o papel.
Nem sempre a
inspiração surge no momento adequado, por isso, blocos e canetas se escondem em
todos os cantos da casa, em todas as bolsas, todos os bolsos, para que as
ideias não se percam e possibilitem um adequado desenvolvimento das mesmas em
seus momentos criativos, sempre solitários.
Quem vive de
escrever – e esses são raros – podem adaptar sua rotina e horários aos momentos
criadores.
Já quem escreve
porque gosta, precisa e quase não tem nenhum retorno prático com isso, deve
ludibriar a rotina a fim de conseguir a plenitude do momento tão especial, que
é o de dar vida às suas criações e seus personagens.
Aparentemente
solitário, na verdade o escritor é super povoado internamente, tem um mundo
interior vastíssimo e preza, mais do que tudo, as pessoas que interagem nesse
mundo, fazendo eco aos seus pensamentos e à sua forma de ser e viver. Trocas de
cartas, de e-mails, de recados nas redes sociais também fornecem o combustível
necessário a quem privilegia a palavra escrita.
O silêncio de quem
escreve é apenas aparente, uma vez que sua cabeça fervilha, as vozes gritam, as
situações se sucedem e os dez dedos no teclado tornam-se insuficientes para
extravasar tudo o que surge, muitas vezes, aos borbotões.
Em outros dias a
cabeça descansa, bloqueia, se recusa a sugerir o que quer que seja e essa é a
única vantagem de não se escrever profissionalmente, pois, nesses dias, podemos
nos dar o direito de desligar a máquina e alimentar o espírito com boas leituras
e com a observação da vida e das pessoas, o que constitui, em última análise, o
combustível para tudo que se cria.
Mesmo aposentada do
magistério, tenho uma rotina puxada de filha, mãe, avó e dona de casa.
Para driblar a
escassez do tempo e do clima adequado à criação literária, acordo muito cedo,
encho minha caneca de água gelada e escrevo em paz até que o resto da cidade
acorde e os barulhos interrompam a fluidez do pensamento. Ou que o relógio
indique que o primeiro compromisso do dia se aproxima. Esta é a minha rotina,
acredito que cada escritor tenha a sua. Quando era mais nova e meus filhos
crescidos estavam na Universidade, meu horário preferido de escrever era à
noite. Hoje não. À noite estou esgotada, burra, sonolenta e não sai nada que
preste.
Mudei. Mas continuo
escrevendo, porque fui escolhida para fazer isso pela vida afora.
Muitos apreciam e
leem meus livros. Ainda bem.
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