Dia de Finados.
Um dia que deveria ser desnecessário, como quase todos os dias dedicados a lembrar
disto ou daquilo. Quem precisa ser lembrado é porque não lembra, não sente
falta, não se importa.
De pouco valem
as lágrimas escassas, as flores logo murchas e as rezas apressadas por quem foi
esquecido depressa demais e cujo tempo na terra não foi valorizado e apreciado
como deveria.
Quem hoje optou
por substituir filhos por animais domésticos e amigos pela solidão da casa
arrumada e pela privacidade, hoje valorizada acima de tudo, talvez não tenha
quem segure a alça do caixão, tampouco lembre de colocar uma florzinha em sua lápide.
Sempre que vou
a Alegrete corro para visitar o túmulo dos meus familiares, como se eles
estivessem ali esperando a minha visita.
Não gosto de
cemitério, acho que ninguém gosta, no entanto, mesmo de longe, pagamos uma
pessoa para manter bem limpo e ajeitado o lugar onde repousam os ossos daqueles
que foram importantíssimos para nós.
Minha avó tinha
um cuidado, um esmero extremo com o lugar, onde hoje ela também se encontra e
eu mantenho sua tradição.
Meu pai caminhava
pelas alamedas do cemitério comentando sobre os nomes, as famílias, contando
causos e um dia me confidenciou que já tinha mais amigos ali do que do portão para
fora.
Hoje, nas
grandes cidades, as pessoas estão optando pela cremação. Acho uma forma muito
radical de se eliminar os vestígios de alguém, ainda que a outra opção não
melhore grande coisa. Doação de órgãos sim, me parece a maneira mais bonita de
se eternizar alguém!
Leio hoje que
alguém descobriu uma forma de transformar as cinzas de uma pessoa em diamante.
Aí sim! Eu, que detesto fogo até depois de morta, aceitaria ir para a fornalha
se pudesse, depois, virar um anel para a minha netinha. Ficaria feliz, de onde
meu espírito estivesse, enfeitando o dedo de uma linda moça que um dia foi a
minha companheirinha. De repente, a tal da cremação assumiu a face da
transformação para mim e até gostei.
Acontece que
tanto a cremação quanto a transformação das cinzas em diamante é um processo
muito caro, mais uma vez ao alcance de poucos. E o jeito vai ser ficar guardada
num cantinho do coração dela e nas poucas joias que lhe deixarei de herança.
Minha
eternidade será preservada para as futuras gerações da família nos meus livros,
onde está vertido o melhor de mim, inclusive os telefonemas que não dei e as
conversas que não tive. E vou sempre preferir ser lembrada no meu aniversário,
nas festas de família, nos concertos, no teatro, nos balés, nos recitais e em
tudo que envolver arte.
Voltando aos
diamantes e conhecendo o lado B do nosso povinho, tenho até medo dos assaltos,
das quadrilhas invadindo crematórios, roubando cinzas e até esvaziando tumbas à
procura de ossos para transformar em diamantes. Deus nos livre! Aí mesmo que
nem morrendo estaremos livres da bandidagem!
Eu adoraria
permanecer no dedo de uma netinha, dormir na caixinha de veludo do seu armário e
estar presente em todos os momentos importantes para ela, dando força, coragem,
parabéns. Seria muito bom!
De qualquer
maneira, se existe alma e espírito, estaremos unidas de todo jeito, porque, já
dizia o Pequeno Príncipe, “o essencial é invisível aos olhos e só se vê bem
como coração.”
Um comentário:
Diamante é pedra bruta, depois de lapidado passa a ser brilhante: assim são os teus textos!
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