Poucas pessoas, fatos
ou coisas conseguiriam me trazer de volta ao computador nestas férias cada vez
mais mirradas (já perceberam como o tempo passa mais rápido depois de uma
“certa idade”?).
Nem Bin Laden, nem Argentina, nem Popó, nem Guga, nem
futebol, nada disso valeria o tempo longe da praia, se bem que este verão está
mais para cinema e pipoca, com tantas chuvas, ventos e frio.
Pois uma simpática cachorrinha, vira-lata puríssima, tanto
me assediou que mereceu uma crônica.
Na verdade, ela me adotou durante as caminhadas diárias que
faço nas ruas desertas do Balneário (um bairro do Continente). É uma cachorra
adulta, jovem e esguia, de pelo curto brilhoso, pretinho, apenas com as patas e
as sobrancelhas manchadas de amarelo. Batizei-a de Preta, por motivos óbvios, e
porque precisava dirigir-me a ela de alguma maneira, uma vez que passamos uma
hora por dia juntas e já enfrentamos alguns perigos.
Este bairro onde caminho é residencial, tem pouco movimento
de carros, é mais perto do mar e o ar é mais puro. Só tem um senão, que antes
não me causava maiores cuidados: é cheio de cães de guarda das pomposas
residências e grandes vira-latas rondando os lixos fartos. Minha presença não
costumava incomodá-los, entretanto, parece que todos têm verdadeira aversão à
minha nova amiguinha. De repente, surgem cães ferozes jogando-se contra os
portões fechados e outros soltos , mais barulhentos e menos perigosos,
colocando a pobre Preta em maus lençóis.
Até aí tudo bem, tudo normal, SE a danada não se arvorasse
em minha propriedade e me cobrasse proteção. Sim, porque ela corre para mim,
chega a subir com as patas dianteiras nas minhas costas, como se eu a tivesse
visto nascer. E lá vou eu, com os bolsos cheios de pedras, colocando a
cachorrada a correr... ganho lambidas, sacudir de rabo e até impressões
digitais enlameadas na minha camiseta branca.
Sempre usufruí duplamente das caminhadas, exercito o corpo
enquanto reflito, programo, resolvo coisas. Gosto de caminhar sozinha e rápido,
sem conversar. Muitas coisas da minha vida se resolveram nessas ocasiões.
Todavia, quando nossa cabeça não está boa, quando temos problemas que não
dependem da nossa resolução, acontece de potencializarmos as dificuldades
durante o exercício e voltarmos mais deprimidos do que fomos. Nesse ponto, a
companhia da minha nova amiga tem sido providencial. Andamos em tal estado de
alerta, evitando as ruas de cachorros mais agressivos, que o tempo passa e não
consigo pensar em mais nada. Despedimo-nos na praça, porque não posso tê-la em
apartamento e nem teria coragem de privá-la da liberdade das ruas.
Já tive muitos cachorros, em várias cidades, de diferentes
raças. O último nos foi tirado de forma tão traumática que sofremos até hoje as
consequências da sua passagem pela nossa vida. Não pensava em me afeiçoar tão
cedo a outro animal, porque não sou dessas pessoas que vivem recolhendo animais
das ruas, muito embora tenha simpatia por eles.
Durante muito tempo critiquei duramente os donos de
cãezinhos por gastarem fortunas em Pet Shops, quando poderiam adotar uma
criança.
Hoje mudei um pouco minhas ideias em relação ao tema. Os
cães são amigos fidelíssimos, dão pouco trabalho, fazem mais companhia, enfim,
dão aos donos um amor incondicional, mesmo quando repreendidos ou esquecidos
horas a fio sozinhos. Além disso, se a classe média ou alta faz planejamento
familiar, muitas vezes deixando de ter mais filhos por falta de condições para
lhes proporcionar uma vida razoável, com oportunidades, porque deveria adotar
todos os filhos gerados por irresponsabilidade, por preguiça de recorrerem aos
métodos contraceptivos e até mesmo para usarem a gravidez e os bebês como forma
de extorquir dinheiro da sociedade?
Penso que cada casal tem o direito de planejar sua família
e, se quiser, ter seu animalzinho de estimação, uma vez que batalham para isso
e se privam de muitas coisas para atingir suas metas.
O Governo, os professores, a Saúde Pública, a televisão,
enfim, todos os que quiserem se somar a uma saudável corrente em prol da
educação de todos, notadamente das mulheres, serão bem-vindos e poderão
contribuir de maneira efetiva para a erradicação da violência, refreando estas
verdadeiras máquinas de fazer crianças, sem a mínima condição de
proporcionar-lhes um futuro digno.
Poucas crianças têm a chance de adotar um adulto que as
proteja e que ande com o bolso cheio de pedras para livrá-la dos perigos. É
mais seguro que contem com pais responsáveis.
Bem, está na hora de colocar os tênis e partir para mais uma
caminhada. Encontrarei Preta por lá? Não sei, os fatos episódicos, como o
próprio nome diz, não têm longa duração. Se não a encontrar, pelo menos a
terei imortalizado nesta crônica , que é
o meio mais eficiente de eternizar alguém.
E ela nem sabe que já ficou famosa até no Alegrete...
2 comentários:
Linda crônica!E como sabes que amo os animais, me emocionei com a tua amiguinha de caminhadas.
pparabéns por teu texto, Maria Luiza...
tens a pura e bela poesia em teus escritos...
abraços...
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